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Entrevista a Danilo de Jesus

Danilo de Jesus

Mestre em Engenharia Biomédica pela Universidade de Coimbra. Atual investigador na Holanda pelo programa Erasmus MC.

A ANEEB teve o prazer de entrevistar Danilo de Jesus! O Danilo falou-nos sobre o seu amplo percurso internacional: começou na Finlândia, onde ficou um ano na empresa BioMediTech; fez Doutoramento na Wroclaw University of Science and Technology, na Polónia, no âmbito do programa Marie Curie Initial Training Network; fez um pós-doutoramento na KU Leuven, na Bélgica; e atualmente é investigador na Holanda, pelo programa Erasmus MC.

[Entrevistadora] – Luísa Balbino (ANEEB)
[Entrevistadora] – Adriana Santos (ANEEB)
Lê aqui a Entrevista completa!

[Entrevistadora] Olá a todos, sejam bem-vindos a mais uma entrevista do Biomédicos pelo Mundo! Eu sou a Luísa e sou colaboradora do departamento de Formação e Saídas Profissionais da ANEEB e estou aqui acompanhada pela Adriana que pertence ao departamento de Ensino e Ação Social. Estamos aqui hoje para conversar com o nosso convidado Eng. Danilo Jesus que se tornou mestre em Engenharia Biomédica pela Universidade de Coimbra em 2012. Danilo, muito obrigada por teres aceitado o nosso convite! O Danilo fez uma bolsa de investigação na Universidade de Coimbra durante seis meses; depois, durante um ano, foi research assistant na Biomedi-Tech que é uma faculdade em Tampere; depois fez o doutoramento na Wroclaw University of Science and Technology através do programa Marie Curie Innovative Training Network; procedeu, depois, para um pós-doutoramento em Leuven durante um ano; e, desde 2018, está, também através do Erasmus Marie Curie, na Holanda e é agora o principal investigador no grupo de investigação Eye Image Analysis Group. Sugiro então que comecemos pela tua experiência no Biomedi-Tech: como é que tiveste conhecimento desta oportunidade? Como é que te candidataste? Como é que funcionou o processo?

 

[Entrevistado] Antes de mais, Luísa e Adriana, obrigado pelo convite e parabéns pela iniciativa, uma excelente iniciativa, Biomédicos pelo Mundo é uma excelente forma de mostrar o que é que os biomédicos portugueses andam a fazer pelo Mundo e certamente ia dar-me muito jeito na altura em que acabei o curso também para servir como referência do que é que as pessoas faziam. Mas, relativamente à tua questão, a Biomedi-Tech que é um co-institute entre a Tampere University of Technology e os hospitais de Tampere, na Finlândia. Então, eu fui lá bater porque na altura…aliás, dando um passo atrás, porque eu comecei a fazer investigação em Coimbra numa bolsa de investigação, foi quando começou o meu bichinho pela investigação. Nas bolsas de investigação em Portugal faz-se investigação durante um ano mas não te dá muitas perspectivas de futuro, é um projeto fixo. E então, despertou-me na altura o interesse em sair de Portugal, em sair um pouco da minha zona de conforto, já estava muito, muito confortável em Coimbra, demasiado confortável e então queria sair um pouco da minha zona de conforto e ver o que se faz lá fora. Eu lembro-me que na altura houve um e-mail que passou na mailing list do departamento, e uma das nossas colegas de biomédica que se encontrava na Finlândia em postdoc num período de investigação nesse mesmo instituto, e na altura fiquei interessado, contactei-a, concorri, fui aceite e lá fui eu, passado seis meses de acabar o curso, mais ou menos, para a Finlândia. Eu sou da Madeira, portanto nunca tinha visto neve a sério e então fui  logo diretamente para a Finlândia e passei lá um ano, um ano espetacular. O inverno finlandês é muito engraçado com temperaturas que conseguem chegar aos menos vinte e cinco graus e era engraçado porque eu estava excitado e ficava contente… eu saía de casa e estavam menos vinte e cinco graus, toda a gente deprimida, toda a gente a querer ficar em casa e eu todo contente para o trabalho porque cada dia que passava era uma temperatura mais baixa e era um recorde para mim, um recorde pessoal.  Mas entendo que muitos anos daquilo torna-se um pouco depressivo.

 

[Entrevistadora] E o que é que te levou, então, a realizar o doutoramento fora, neste caso, na Polónia?

 

[Entrevistado] Eu costumo dizer que eu não encontrei o doutoramento, o doutoramento encontrou-me de certa forma. Eu estava na Finlândia, estava a fazer trabalho de investigação, estava a trabalhar com uma técnica que é optical projection tomography na área da óptica e de reconstrução de imagem. E na altura, não sei como, mas através das mailing lists existentes houve este projeto que passou que eu tive a oportunidade de ler, era um novo projeto focado na parte interior do olho que despertou o meu interesse porque a minha tese de mestrado e a investigação que fiz depois da tese de mestrado tinha sido focada na caracterização  da catarata do cristalino do olho com ultra-som. E este projeto que tive a oportunidade de ver era focado também na parte interior do olho, era focado na córnea e então despertou-me o meu interesse natural e na altura até perguntei à pessoa em questão responsável pelo projeto se era possível saber mais sobre o projeto, em que é que consistia o projeto e obtive uma resposta e até disseram que se eu me queria candidatar podia. Mas eu acabei por não o fazer porque nem tinha os documentos todos, lembro-me que pediam três cartas de recomendação, algo do tipo, e eu não tinha os documentos, e  acabei por passar ao lado, não concorri e continuei com a minha vida lá na Finlândia. Mas, passado umas semanas, já depois da deadline da candidatura, recebi um e-mail desta pessoa que tinha contactado anteriormente a dizer “Estou a ver as candidaturas e não estou a ver a tua, certamente perdeu-se. Será que não queres reenviar os documentos?”. Então, pensei “Porque não?” e enviei o meu CV, enviei alguns documentos que era necessário, alguns documentos até ficaram em falta, mas passado dois dias ou três dias depois recebi outro e-mail a dizer que tinha sido aceite para entrevista e então fui apanhado de surpresa mas disse “Sim, faço a entrevista sem qualquer problema”. Acabei por fazer a entrevista com três pessoas espetaculares e passado uma semana disseram que tinha sido aceite. E passou-se tudo isto, nunca pensei em ir, eu estava neste processo mas sem pensar “Eu vou entrar, eu vou fazer um doutoramento”, nunca tinha pensado nisso sequer. Então, do nada, tinha ali aquela oferta num projeto Marie Curie, na altura sabia muito pouco o que era o Marie Curie, tive de pesquisar, mas depois de me informar sobre o que faria, a possibilidade de ter bastante treino dentro do meu próprio doutoramento e o facto de ser numa área que eu gostava que era a área da visão, da oftalmologia fez com que dissesse à minha colega da Finlândia “Olha, vou-me embora. Tenho esta proposta, vou-me embora”. Aliás, ela disse que era uma boa proposta e recomendou-me que se realmente estivesse no  meu lugar também ia e também foi bom ter esse feedback de um sénior, neste caso um colega mais velho, sobre os melhores passos ou percurso a fazer. E lá fui eu, neste caso, para a Polónia sem saber nada sobre a Polónia e foi uma das melhores experiências que eu já tive até agora.

 

[Entrevistadora] Muito bem! E, ou seja, tanto na Finlândia como na Polónia, como é que foram as burocracias, tanto em Portugal como lá? E a língua, porque foste para países diferentes, aprendeste diferentes línguas ou foste-te ambientando, como é que isso funcionou?

 

[Entrevistado] Eu acho que burocracias existem em todo o lado, de uma forma ou de outra. A diferença é…tu consegues perceber o nível de burocracia que há se os documentos estão numa língua que tu percebes ou não. Em alguns casos, por exemplo na Finlândia, a maior parte dos documentos estava em finlandês e em inglês o que torna a tua vida muito mais fácil. Na Polónia já não era bem assim, nem todos os documentos estavam em inglês o que se tornava um pouco mais complicado. Mas,  por outro lado, na Polónia nunca tive nenhum problema com burocracia porque o meu supervisor dizia-me “Danilo, tu trabalhas aqui a fazer investigação. O teu trabalho aqui é fazer investigação. Foca-te nisso e tudo o resto manda para mim que eu trato disso”. Portanto é bastante importante quando vais para um sítio ter alguém lá que te ajude nesse sentido, que, de certa forma, te guie nessa burocracia porque por vezes pode ser muito complicado. E eu acho que de certa forma já respondi à questão da língua, em alguns países, como por exemplo na Finlândia, fala-se muito inglês; aqui em Roterdão toda a gente fala inglês fluentemente, nunca encontrei ninguém que não falasse inglês; na Bélgica as pessoas também falam inglês apesar de, quando começas a ir para a parte francesa, fala-se menos inglês; na Polónia fala-se inglês dentro do meio académico, fora do meio académico fala-se menos inglês. É importante também aprender um pouco da língua local, eu acho isso bastante interessante porque ao aprender a língua local tu envolveste na própria cultura e isso é bonito porque as pessoas também reconhecem isso, que estás a fazer um esforço e brincam contigo de certa forma também, mas ao aprender a língua aprendes de onde é que aquelas pessoas vêm e integras-te muito mais. Portanto eu recomendo aprender sempre a língua independentemente do país para onde vás, não é algo que eu tenha sempre feito mas baseado na minha experiência é algo que eu vivamente recomendo. Mas o inglês é o mais importante e a melhor forma de aprender inglês é sair de Portugal.

 

[Entrevistadora] A próxima pergunta que eu te queria fazer prende-se com os diferentes sistemas de ensino. Queria perguntar-te o que é que notaste de diferente nos sistemas de ensino dos países em que estiveste e as principais diferenças que notaste em relação aqui ao nosso país.

 

[Entrevistado] É uma boa questão. Eu já não tenho aulas há algum tempo, mas há determinadas coisas que são muito diferentes. Por exemplo, agora mais recentemente, tenho a oportunidade de fazer supervisão de alunos de mestrado e de licenciatura o que me faz lembrar das burocracias que nós tínhamos no nosso sistema de ensino, as limitações que tínhamos em Portugal, inclusivé tenho aqui alguns alunos de Portugal até. Mas, vamos por partes, deixem-me dar um exemplo de como as coisas podem ser diferentes do ponto de vista do aluno. Eu lembro-me de quando estudei em Coimbra, eu ia muito informal para a universidade, ia de T-shirt e calções, no verão de chinelos e ia fazer os meus exames assim, sem qualquer problema, não era por isso que ia ter melhor ou pior nota. Mas eu lembro-me de quando cheguei à Polónia, logo nos primeiros meses calhou na altura dos exames e eu lembro-me de ver muitos colegas a irem para as aulas vestidos muito formalmente então eu no início até pensei que fossem alguns itens especiais. Mas eu vi de tal forma, tão frequente que perguntei aos meus colegas de doutoramento “Porque é que vêm vestidos de fato, tão formalmente?”, eram miúdos novos e vias que o fato não era deles, era dos pais ou dos avós de tão  largo que ficava e então ele disse-me que alguns professores lá, conservadores, exigiam que os alunos fossem vestidos de forma formal para os exames. E para mim, aquilo fazia um pouco de confusão porque se eu fosse fazer exames lá eu não fazia nenhum porque ia sempre vestido de forma informal para a universidade. E portanto essa era uma das formas que mostrava essa diferença entre professor e aluno, essa foi uma das diferenças que notei. Mas uma coisa que noto agora que faço a supervisão de alunos são as teses de mestrados, eu tenho alunos aqui que fazem a tese de mestrado e a tese é um paper, seis páginas e a tese está feita. E para mim, como investigador, é isso que me interessa, é aquele paper, aquelas páginas. Entretanto tenho alunos de Portugal em que a tese de mestrado são cem páginas e eu sei o que é, também fiz essa tese de cem páginas há uns anos atrás. Mas aquilo tem alguma utilidade? Não, não tem. Qual é a utilidade de eu escrever o que é o olho em quinhentas teses? Não tem, toda a gente sabe o que é o olho. Portanto, é uma das coisas que eu noto, aqui são muito mais objetivos enquanto que em Portugal ainda existe um pouco este sistema de escrever documentos que ficam ali guardados para sempre e que ninguém vai ler, enquanto que se for uma coisa concisa em forma de paper poderia ter muito mais utilidade para a comunidade e isso é uma das coisas que eu noto na diferença dos sistemas de ensino. Uma das coisas também bastante interessantes que eu vejo aqui com os alunos de technical medicine é que há muitos maus estágios, há muito mais contacto com os grupos de investigação e com o mercado de trabalho, o que te dá uma maior noção do ambiente fora da universidade. O facto de poderes fazer diferentes estágios, de poderes estar em diferentes lugares permite-te, durante o curso, perceber aquilo que queres fazer após terminar o curso. E o que eu sinto, através da experiência que eu tenho e através daquilo que eu vejo dos alunos é que não sabem aquilo que querem fazer quando acabam o curso, a primeira prioridade é arranjarem emprego e alguns deles até antes de acabar o curso, o que é mau porque assim não acabam a tese. Mas nota-se isso, enquanto que aqui fazem diferentes estágios e quando acabam, ou já têm contactos de onde fizeram estágios e vão para lá, ou então sabem aquilo que realmente querem, se querem mais programação, se querem mais a parte da gestão, se querem mais interação com o cliente, etc.

 

[Entrevistadora] Já são algumas diferenças, um bocadinho grandes.

 

[Entrevistado] Sim, o ensino em Portugal, nomeadamente na parte da biomédica, precisa de uma determinada reforma porque o que eu vejo hoje em dia é que pouco ou nada mudou desde quando eu entrei no curso. Já não há mestrados integrados, meteram uma pequena tese no final da licenciatura que se aproxima mais daquilo que se tem aqui, mas ainda assim ainda existe um grande gap entre aquilo que se aprende em Portugal e aquilo que se aprende fora de Portugal, pelo menos dando o exemplo daqui dos Países Baixos.

 

[Entrevistadora] Acerca do programa Marie Curie que já falaste um bocadinho acima, podes explicar em que é que consiste, o que é que se faz efetivamente?

 

[Entrevistado] Sim, deixa-me só corrigir uma pequena coisa que disseste no início. Eu fiz a Marie Curie como aluno de doutoramento, foi um programa doutoral, mas eu estou Holanda já não tem relação com Marie Curie, foi só uma pequena correção. Mas falando agora do programa, há diferentes secções ou programas: há Marie Curie para alunos de doutoramento, mas também há para postdoc. Mas falando daquilo que mais interessa para vocês que é doutoramento, Marie Curie é um programa que te permite fazer doutoramento dentro de uma network, ou seja, existem vários alunos a fazer o doutoramento em diferentes instituições sobre um tema específico. Ou seja, existe partilha de informação entre os diferentes doutoramentos, o que é bom porque durante o programa de doutoramento, tu tens de ir a outras universidades, não só à universidade que te acolhe, o que te permite estar em outros grupos de investigação e fazer trabalho em outros grupos que se relaciona também com o teu doutoramento. Portanto é uma network em que os projetos estão todos ligados, e promove a mobilidade de pessoas dentro da União Europeia e portanto se tu tiveres vivido determinados anos naquele país,  não podes concorrer para aquele país, tens de concorrer para um projeto noutro país. É uma das vantagens, outra das vantagens é que normalmente nos projetos Marie Curie, o valor que é utilizado para a bolsa é muito superior às bolsas normais que são oferecidas para fazer doutoramento, o que dá uma estabilidade também durante o período de doutoramento porque podem focar-se apenas na vossa investigação e não precisam de estar preocupados com o vosso salário e com as vossas condições no final do mês.

 

[Entrevistadora] Penso que já podes ter respondido a esta pergunta, mas o que é que te ensinou esta experiência e ainda também perguntar-te se te arrependes de algo até agora.

 

[Entrevistado] A experiência geral ou experiência do doutoramento?

 

[Entrevistadora] Do doutoramento, sim.

 

[Entrevistado]  Eu acho que a Marie Curie, os projetos Marie Curie são uma grande vantagem, eu acho que te dá uma determinada bagagem ou seja força-te não só estás a fazer o teu projeto mas força-te a colaborar com outros grupos. Há a oportunidade de participar em muitos  Training Summer School Winter Schools, a oportunidade de viajar e de ir a diferentes conferências. Basicamente, a Marie Curie constrói de certa forma dá-te bagagem para tu construíres uma determinada carreira naquela área específica e é uma grande vantagem, aprendes muito, aprendes muito. Portanto é algo, hoje em dia, quando alguém me diz que gostava de fazer um Doutoramento eu digo, olha primeira coisa tens que fazer vai ao site EURAXESS e lá tens todas as ofertas a nível europeu. Se encontrares algo Marie Curie na área que tu gostes concorre a porque é uma grande oportunidade. Se eu me arrependo de alguma coisa? Não, não me arrependo, acho que é difícil de arrepender-se porque não sabes se tomasses uma decisão diferente se realmente estarias melhor do que aquilo que estás ou não. Acho que o importante é sempre quando tomas qualquer decisão, o quer que seja, é que não tenhas medo de sair da zona de conforto, e se realmente estás a pensar em fazer algo quer dizer que queres, não é? Portanto vai e experimenta e se não gostares voltas sempre à base. Foi sempre o que eu pensei, vou sair de  Portugal se não gostar, apanho um avião e venho embora. Portanto, não, não há problema, aliás eu digo isto porque eu sou da Madeira e então eu saí em 2007 e então tinha sempre também que apanhar um avião para ir para Coimbra, não é? E então vinha a casa, tinha que apanhar um avião para casa, da mesma forma que estou aqui apanho um avião para casa, é igual. Portanto, acho que é muito bom sair da zona de conforto, sair da zona de conforto significa que estás a aprender alguma coisa.

 

[Entrevistadora] Obrigada e tendo agora uma pergunta um pouco mais geral que tem a ver com o nível de vida nos diferentes países em que tiveste a trabalhar. Podias esclarecer e dar algumas informações de como são quando comparados aqui com com Portugal e depois quais foram as maiores diferenças que sentiste em relação ao nosso país?

 

[Entrevistado] Uma boa questão, eu só trabalhei 6 meses em Portugal, portanto eu acho que trabalhei mais em todos os outros países do que em Portugal. Eu trabalhei com uma bolsa de investigação segurança social voluntária, ou lá como se chama, portanto não tenho assim uma grande experiência de Portugal. O que eu posso dizer é que entre os diferentes países que eu que tive, sim, há uns países melhores do que outros. Por exemplo, na Polónia não tenho grande referência porque tal como eu disse a minha bolsa é uma bolsa Marie Curie, é um valor específico por Bruxelas e a seguir é corrigido pelo país em que tu estás. Portanto, eu não sei o que é que é fazer um doutoramento, por exemplo com um salário de lá. Eu sei que quando eu comecei os salários não eram assim muito famosos lá, mas hoje em dia os salários, por exemplo na Polónia são equiparáveis aos salários de Portugal se não melhores. Mas relativamente aos outros países, mais agora recentemente para a Holanda, eu acho que as condições são muito boas, por exemplo tu quando vens para Holanda e se vieres já com  Phd  durante 5 anos pagas menos 30% de impostos, o que dá-te um salário mais  confortável também. Isto aplica-se não só academia mas também fora da academia. O facto, por exemplo, uma das coisas que eu gosto aqui é que toda a informação está digitalizada e por exemplo  com uns simples cliques vou ao site consegues ver qual é que vai ser o valor da reforma já. Essas coisas, estás a ver. E então aí e tudo o que tu descontas tudo, tudo direitinho. Enquanto que às vezes, em Portugal acho que não sei, se calhar é porque eu não tenho muita experiência em Portugal, mas acho que pelo menos experiência que eu vejo dos meus colegas já é muito mais complicado em termos de burocracia. E perspectivas também para o futuro. Portanto, sim acabas por ter salários muito melhores fora Portugal, apesar das coisas hoje em dia estarem um pouco mudar para o trabalho remoto também. Mas é complicado dizer, porque não sei, eu acho que as coisas mudaram tanto nos últimos 5 anos mesmo, tu olhas para o preço da habitação e o preço das rendas em cidades como como Lisboa, que as rendas agora são absurdas a eu acho que as coisas estão a mudar tão rápido que por exemplo arrendar, se calhar casa em Lisboa começa a ser parecido a arrendar casa aqui em Roterdão, quando os salários não tem nada a ver. Mas é complicado dizer não é, e se calhar eu acho que há meia dúzia de países em que realmente a qualidade de vida mais superior, por exemplo a Suíça, mas relativamente à Holanda, aos Países Baixos, o que eu posso dizer é que as condições são muito boas.

 

[Entrevistadora] Agora assim uma pergunta mais pessoal, o que é que te vês a fazer profissionalmente daqui a 5 anos? E considerarias voltar para Portugal?

 

[Entrevistado] Pois, eu acho que daqui a 5 anos, espero continuar aqui na Erasmus MC. Aliás tudo indica que sim. Mas espero já estar como associate professor e basicamente espero estar numa posição em que nunca me imaginei quando estava a fazer o curso. E voltando um pouco atrás no tempo, eu quando estava a fazer o curso, quando estava na vossa posição, nunca pensei em fazer investigação de todo. Não, não me interessava de todo nenhum fazer investigação, antes de entrar no curso, durante o curso. Só comecei a pensar em investigação quando comecei a fazer a tese de mestrado, foi aí a parte em que fiz o clique. Hoje em dia, gosto muito daquilo que faço, acho que a investigação é muito interessante. Aquilo que tu fazes, aquela ideia que nós temos de investigação quando estamos a fazer o curso, não corresponde muito à realidade. Por exemplo, no meu caso concreto, nós trabalhamos em diferentes projetos, trabalhamos em projetos europeus, fazemos também desenvolvimento de software que vai ser integrado em instrumentos. Portanto é todo um trabalho de desenvolvimento, também é um trabalho de investigação, mas é um trabalho de desenvolvimento. E eu espero estar a continuar a fazer isso daqui a 5 anos. Recentemente, comecei com o meu grupo de investigação juntamente com a minha colega Luísa. Basicamente o nosso grupo de investigação reúne toda a parte de image analysis, em oftalmologia na área de Roterdão, ou seja tem a nossa instituição Erasmus MC, departamento de oftalmologia e radiologia, mas também envolve outra instituição que é o Rotterdam hospital. E o facto de poderes trabalhar com diferentes centros e fazer a simbiose dos diferentes conhecimentos que nós temos, em termos de imagiologia, em termos de artificial intelligence, com os conhecimentos clínicos, é espetacular. Eu espero continuar a fazer isso, na altura se calhar até à frente de uma de uma grande Marie Curie com um determinado conjunto de número de alunos também, que foi daí que o que eu vim também.

 

[Entrevistadora] Muito bem! Agora a última pergunta. Que conselhos é que davas a alguém que quisesse estudar no estrangeiro em qualquer grau, só ir para fora?

 

[Entrevistado] Uma boa questão. Eu acho que é importante experimentar, é importante sair. Eu acho que o programa Erasmus é uma primeira porta. Eu não fiz Erasmus quando estava na UC, eu sempre tive aquela ideia de eu sou da Madeira, já estou em Erasmus, não preciso de fazer Erasmus, o que não é verdade.Acho que quando sais fora de  Portugal é completamente diferente e acho que é bom conhecer as pessoas de outras culturas, de outras nacionalidades, isso é bastante bom tu sais da tua zona de conforto, melhoras o teu inglês, tu vês outras formas de estudo  e começas a perceber que realmente é fácil sair de Portugal, só precisas do teu cartão único. Portanto, o meu conselho é saírem.  Começarem, por exemplo, com um programa Erasmus que é um pequeno passo, é um passo assim mais soft e se realmente gostarem daquilo, por exemplo tentarem fazer uma tese fora de Portugal. Isso é uma das coisas que nós agora estamos a tentar proporcionar, já conseguimos através dos últimos 2 anos, em colaboração com o colega  Pedro Vaz da Universidade de Coimbra em que, por exemplo a primeira metade da tese é feita em Coimbra e metade da tese é feita aqui, e tem corrido bem. Porque a seguir dá-te a  possibilidade, por exemplo, do programa Erasmus + , poder fazer a seguir e poder estar num grupo de investigação e depois, não só fazer a tua tese mas ver o que os outros colegas estão a fazer no grupo. Mas, se calhar, às vezes acho que o mais fácil é mesmo contactar alguém, contactar um colega quer seja português ou quer seja de biomédica ou então mesmo um determinado investigador e dizer que “tenho interesse no vosso trabalho, eu gostava de fazer uma tese de mestrado na vossa área, será que há possibilidade de fazer isso?” Existem os programas Erasmus+ ou será que existem possibilidade de financiamento e contactar as pessoas. Hoje há muita reticência, muitas vezes nós quando somos alunos pensamos que não, não vou enviar um e-mail para quê? Não vão responder ou nem sequer vão ver. O que não é verdade, eu vejo sempre, por exemplo eu vejo sempre se me enviarem qualquer coisa, eu vejo sempre e respondo sempre, mesmo se for no LinkedIn. Olha, mesmo a semana passada teve um miúdo de física médica de Itália e ele estava a perguntar sobre a minha carreira, não sei como é que ele viu o meu LinkedIn, mas estava perguntar o que é que eu tinha feito e o que é que tinha concorrido e olha mandei lhe um testamento basicamente com vários conselhos e ele acho que não estava à espera mas ficou todo contente. Portanto, isto para dizer que vocês não tenham problemas de contactar investigadores mais seniores porque as pessoas já tiveram na vossa posição, portanto sabem sabem como é que é, não é. Mas, é isso. O meu conselho, se calhar resume-se no seguinte: não tenham problema em sair da  zona de conforto, é bom para vocês, estiverem muito confortáveis quer dizer que vocês não estão a aprender nada.

 

[Entrevistadora] Por fim, gostaria de agradecer pelo teu tempo e disponibilidade, Danilo. Foi um prazer e, com certeza, conseguiste inspirar alguns daqueles que nos ouvem a experimentar um percurso diferente, por isso muito obrigada. Desejamos-te tudo de bom no teu percurso profissional.

 

[Entrevistado]: Obrigada!

 

A ANEEB agradece por teres aceite esta entrevista e pela partilha da tua experiência fora de Portugal, esperando com isto ajudar outros estudantes que estejam prestes a tomar esta decisão. Votos de sucesso!