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Entrevista a Beatriz Pereira

Beatriz Pereira

Mestre em Engenharia Biomédica, formada pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD)

A ANEEB teve o prazer de entrevistar a Beatriz Pereira, uma Mestre em Engenharia Biomédica, formada pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). A Beatriz falou-nos acerca da experiência que viveu na Holanda, enquanto realizava a sua tese de mestrado no ramo da Bioeletrónica, na Technische Universiteit Delft.

[Entrevistadora] – Telma Esteves (ANEEB)

[Entrevistada] – Beatriz Pereira

 

Vê aqui a Entrevista completa!

[Entrevistadora] – Conta-nos um bocadinho sobre ti, como surgiu a vontade de te aventurares numa experiência internacional?

[Entrevistada] – Essa é uma longa história que começa com o meu ingresso em Engenharia Biomédica. Aquando do meu último ano do ensino secundário, ainda não tinha muitas certezas acerca do que queria seguir no ensino superior. Felizmente, não ingressei em Medicina e acho que foi a melhor coisa que me aconteceu. Ingressei na licenciatura em Engenharia Biomédica na UTAD, motivada para tentar, descobrir e dar o meu melhor. Fiquei imediatamente apaixonada por todas as oportunidades que podíamos conquistar enquanto engenheiros biomédicos e, nesse sentido, decidi dar seguimento à minha formação com o mestrado também em Engenharia Biomédica, desta vez na FEUP. Para além de estudar, tentei sempre criar ocasiões transversais que me dessem outro tipo de competências (associativismo, voluntariado,…), no entanto cheguei ao final do meu 4º ano e senti que me faltava alguma coisa no currículo: a tal experiência internacional. Nunca exteriorizei grande interesse em fazer cadeiras lá fora, mas vi-me de facto a desejar muito ter essa experiência, ainda que de outra forma. Dirigi-me aos gabinetes de apoio na FEUP e manifestei então o meu interesse em fazer alguma coisa lá fora, fosse um estágio, ou a tese.

[Entrevistadora] – E a partir daí, o que aconteceu até chegares a Delft?

[Entrevistada] – Felizmente, logo nesse mesmo dia, a pessoa com quem falei (que acabou por vir a ser o meu orientador da tese) contactou-me com a boa notícia de que tinha opções para mim. Iria então realizar o primeiro semestre da minha tese na Universidade Técnica de Delft, na Holanda, e terminá-la cá, no Porto, no segundo semestre do último ano de mestrado. 

[Entrevistadora] – Um detalhe que acaba por assustar muito os estudantes são os processos burocráticos de uma passagem académica pelo estrangeiro. Nesse sentido, sentiste muitas dificuldades, consideras que tiveste sempre apoio?

[Entrevistada] –  Uma facilidade que temos quando não nos estamos a candidatar a um Erasmus Estudos, mas sim a um Erasmus Estágio (o que fiz e que nos permite realizar quer um estágio lá fora, quer a tese), é o facto de muitas vezes ser o próprio orientador a agilizar os contactos, ao invés de nós estudantes. Desta forma, os problemas burocráticos ocorreram mais no sentido da seriação para a tese que eu queria, mas isso, felizmente, também correu tudo bem e a partir desse ponto já praticamente tinha ingressado. 

[Entrevistadora] – E quanto à tua tese, o que fizeste e com quem?

[Entrevistada] – A minha tese realizou-se na área da microeletrónica médica, onde desenvolvi um implante dentário com microeletrónica analógica integrada. A vertente da eletrónica sempre me fascinou bastante, sendo que em Delft estive no departamento de Microeletrónica e Bioeletrónica. A equipa que lá conheci e com quem trabalhei era bastante vasta: muitos profissionais tinham também formação em Engenharia Biomédica, outros em Eletrotécnica, Informática, Medicina, contudo todos naquele departamento estavam efetivamente focados na área da Eletrónica Médica. Tínhamos reuniões semanais para discutir os nossos projetos. 

[Entrevistadora] – Ao nível da receção, sentiste-te bem recebida e que tinhas apoio lá?

[Entrevistada] – Fui extremamente bem recebida, já toda a gente sabia da minha chegada e passados 1 ou 2 dias já estava a ir a reuniões. Gostei muito de não ter um horário para ir às aulas, estudar para testes e exames. Trabalhei com uma equipa de investigação e era fantástico como num piso inteiro, com cada pessoa a fazer uma coisa diferente, em qualquer porta a que batesse era bem acolhida e toda a gente estava disposta a esclarecer-me dúvidas. Foi mesmo gratificante poder ver como era a mentalidade de cooperação num país como a Holanda. 

[Entrevistadora] – Falemos agora então da Holanda. Já tinhas intenção de ir para lá? O país foi determinante na tua escolha?

[Entrevistada] – Não tinha intenção nenhuma. A tal primeira conversa que tive foi mesmo exclusivamente centrada na minha vontade de ir para fora, fosse para outro continente, fossem dois meses, três meses, o que fosse, eu queria era ter uma oportunidade para estar a viver no estrangeiro, não fazer lá umas férias. Quando me foi mencionada a Holanda, ainda por cima a Universidade de Delft, fiquei bastante feliz e nem pensei duas vezes.

[Entrevistadora] – E ao nível do alojamento? Tiveste dificuldade em conseguir um lugar para ficar?

[Entrevistada] – Aí sim podem surgir alguns problemas provenientes de não se ser um aluno de Erasmus Estudos mas sim de Erasmus Estágio. Muitas das vezes existem contactos internos, pela universidade, que facilitam o processo, no entanto normalmente o Erasmus Estudos tem início mais cedo do que o Erasmus Estágio, que depende muito mais da disponibilidade da equipa em receber uma pessoa nova. No meu caso, tive a sorte de conseguir casa antes de ir sequer para lá, o que foi uma mais-valia. Para isso tentei ser uma boa portuguesa e “desenrascar-me”: falar com pessoas de lá através de redes sociais, pedir contactos a um “amigo de um amigo” que esteve lá… Logo aí aproveitas e começas a falar inglês. 

[Entrevistadora] – Sentiste algum tipo de choque cultural ou dificuldade na adaptação? 

[Entrevistada] – Chegada lá, ainda que tivesse já casa, ainda tive muitas coisas a que me habituar no estilo de vida, sim. Primeiramente, ninguém tem carro: 90% dos estudantes andam de bicicleta e os outros 10% que residem mais longe deslocam-se de transportes públicos apenas. Arranjei uma bicicleta e apercebi-me de que lá fora muitas vezes o estilo de vida não é tão facilitado quanto nós cá temos. Seguramente que ter de acordar todos os dias e fazer logo 10km de bicicleta fez-me uma pessoa diferente e chegar cá com outro espírito de sacrifício (apanhei o maior nevão dos últimos anos na Holanda e lá fui eu à mesma de bicicleta!). A Universidade de Delft, devido ao renome mundial, tinha também muitos estudantes estrangeiros, de outros continentes, que obviamente tinham culturas muito diferentes da minha e essa interação foi deveras positiva. Uma das minhas grandes aprendizagens foi a nível cultural, tendo colegas de casa indianos e costa-riquenhos. Ainda hoje mantemos contacto. 

[Entrevistadora] – O holandês (idioma) foi uma barreira para ti?

[Entrevistada] – É um país em que a língua não é de todo uma barreira: toda a gente, seja num supermercado, correios, seja um senhorio, tenha 20 ou 50 anos, sabe falar inglês. 

[Entrevistadora] – E em relação ao nível de vida da Holanda, como o achaste face a Portugal?

[Entrevistada] – Senti que economicamente o custo de vida era mais caro, no entanto senti também que a qualidade de vida era superior.  

[Entrevistadora] – De volta a Portugal, terminaste o curso e entretanto chegámos ao dia de hoje. Qual é a tua atividade profissional atual? É “cá dentro” ou “lá fora”?

[Entrevistada] – Neste momento encontro-me a trabalhar em território português, no Porto, numa empresa multinacional (a Synopsys Inc.), onde até acabo por ter diariamente um contacto mais internacional do que nacional. Encontro-me a exercer microeletrónica, enquanto estou em contacto com todo o mundo. 

[Entrevistadora] – Achas que o teu Erasmus foi uma mais-valia para o emprego que agora assumes?

[Entrevistada] – Sim, foi extremamente interessante ter uma experiência internacional no meu percurso académico e isso fez com que agora não seja tão complicado lidar com as diferentes culturas, horários de trabalho, idiomas, com que lido no meu quotidiano. Após ter começado a trabalhar na Synopsys vim a descobrir que um dos meus colegas de trabalho fez Erasmus também em Delft e sim, seguramente que ter feito Erasmus foi uma vantagem para ter entrado na empresa onde entrei e onde estou muito feliz.

[Entrevistadora] – O que aconselharias neste momento a alguém que planeie ir?

[Entrevistada] – Em primeiro lugar diria para não terem medo. Os primeiros dias não são fáceis e vão sempre haver momentos em que chegarás a casa com um sentimento de saudade extrema pela família e amigos. No entanto, tenho também a dizer que os meus pais descobriram a videochamada nesta altura, ligavam-me todos os dias e assim o longe acabou por se fazer perto. Não têm de aceitar todas as oportunidades destas que aparecerem, mas percam pelo menos 5 minutos a pensar se vale a pena ou não. Porque no fundo, se hoje tens medo de arriscar, não estás preparado/a para o futuro que se aproxima, uma vez que o local em que estás hoje não te indica, em nada, o local onde estás amanhã. Cada vez mais as empresas não estão enclausuradas num pequeno raio de distância, mas sim têm as suas portas abertas para todo o mundo. É um ótimo primeiro momento para te pores à prova e veres se estás pronto/a para assumir o futuro que está à tua espera. 

[Entrevistadora] – Muito obrigada, Beatriz, por teres despendido um bocadinho do teu tempo nesta entrevista e pelas motivadoras palavras, espero que ajudes muitos estudantes que ambicionem ter uma experiência semelhante à tua. 

[Entrevistada] – Obrigada eu mais uma vez pelo convite, e por se terem lembrado de mim!

A ANEEB agradece por teres aceite esta entrevista e pela partilha da tua experiência fora de Portugal, esperando com isto ajudar outros estudantes que estejam prestes a tomar esta decisão. Votos de sucesso.