Entrevista a Andreia Almeida

Andreia Almeida
Eng. Biomédica pela UTAD e UP, atual Translational Scientist nos Países Baixos
A ANEEB teve o prazer de entrevistar Andreia Almeida! A Andreia falou-nos sobre a sua experiência internacional no Reino Unido e noutros países, como Israel, quer como estagiária ou integrante em Short Term Scientific Missions!
[Entrevistadora] – Ana Mesias (ANEEB)
[Entrevistador] – Pedro Carreiro (ANEEB)
[Entrevistadora]: Olá a todos, sejam bem vindos a mais um episódio do “Biomédicos pelo Mundo”! O meu nome é Ana Mesias, sou colaboradora do Departamento de Formação e Saídas Profissionais da ANEEB e estou acompanhada pelo Pedro Carreiro que pertence ao Departamento de Ensino e Ação Social. Hoje iremos conversar com a Andreia Almeida. A nossa convidada é licenciada em Engenharia Biomédica pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, mestre em Engenharia Biomédica pela Universidade do Porto e Doutorada em Ciências Biomédicas, também, pela Universidade do Porto. Antes de ingressar no seu trabalho atual, como Translacional Scientist nos Países Baixos, teve oportunidade de realizar diversas experiências a nível internacional, as quais iremos descobrir ao longo deste episódio. Andreia, muito obrigada por teres aceitado o nosso convite! Começando por abordar uma das tuas primeiras aventuras no estrangeiro, regressamos a 2016, ano em que realizaste um Summer Internship na Universidade de Newcastle, no Reino Unido. Como foi esta experiência e como é que tiveste conhecimento da mesma?
[Entrevistada]: Em primeiro lugar, obrigada pelo convite e por poder partilhar a minha experiência com vocês e com todos os outros alunos que vão ver, no futuro, este episódio. Sim, em relação ao Summer Internship eu acho que descobri de forma aleatória, através daqueles emails que às vezes recebemos, que subscrevemos, e eu acho que já tinha o nome do projeto, na altura, e eu achei que o projeto se enquadrava bastante com a minha tese de mestrado e eu pensei “Porque não concorrer?”. Às vezes nós temos aquele sentimento de que nunca vamos conseguir e de que os outros é que conseguem e que, às vezes, nem vale a pena tentar, mas eu lá concorri e depois passei à segunda fase e fiquei muito contente, mas sempre com aquela expectativa de que poderia não dar em nada. Mas, depois, quando recebi, realmente, a resposta fiquei, claro, muito contente. Tive, entretanto, que acabar a minha tese de mestrado ou defender a minha tese de mestrado assim mais rápido para poder participar no programa. O programa foi cerca de 1 mês, na Universidade de Newcastle. Este programa da PARSUK é através de investigadores e estudantes portugueses que estão no Reino Unido, então, eu também estive com um portugês, o Ricardo, e ele foi o meu orientador, na altura, e o nosso projeto era para encapsular células com material que eu estava a trabalhar. Então foi uma experiência muito boa, porque consegui aprender técnicas novas, já tinha acabado o mestrado e, por isso, já tinha algum background no laboratório, mas foi bom ter uma perspetiva diferente. Em termos pessoais também é muito bom, porque conheces uma cultura nova e diferente. E, na altura, o meu inglês ainda não era assim muito bom, então ir para o Reino Unido, e eles também têm um sotaque bastante particular, no início foi um bocado complicado, mas acho que faz parte e que é enriquecedor no final, porque vais praticando e vais aprendendo palavras novas e ganhando mais vocabulário. Então, ao fim e ao cabo, é sempre uma coisa boa quer a nível profissional, porque também te dá experiência, mas também a nível pessoal porque vais melhorando algumas coisas, soft skills, vais conhecendo pessoas novas, que pode ser importante para a tua rede de contactos no futuro. Portanto, foi uma experiência boa e aconselho a toda a gente, mesmo que vejam a oportunidade e achem que não vão conseguir, para tentar porque o não está sempre garantido, por isso, mais vale tentar.
[Entrevistador]: É isso, completamente. Fazendo aqui, se calhar, a passagem para uma altura mais recente, também pudemos observar que no doutoramento também pudeste realizar várias Short Term Scientific Missions, em diferentes países. Gostaríamos de saber como é que tiveste esta possibilidade, também?
[Entrevistada]: Sim, eu depois que voltei de Newcastle, voltei para o instituto onde eu trabalhava, no i3S, onde fiz a tese, naquele momento, e comecei a trabalhar lá. Depois, entretanto, concorri a doutoramento e, quando comecei o meu doutoramento, nós recebemos uma aluna através dessas Short Term Scientific Missions no nosso laboratório e eu estive a trabalhar bem de perto com ela, estava a ajudá-la, porque trabalhávamos em áreas semelhantes, e foi ela que me falou da COST, que é a entidade que financia estas Short Term Scientific Missions. Ela era de Israel, inclusivé, e esteve a explicar como é que funcionou, como é que se candidatou, o processo. E eu disse: “Hum, acho que é uma experiência interessante, também gostava de fazer uma coisa desse género”. Então, ela também começou a falar um bocado do que havia na universidade dela, em Israel, e alguns grupos e eu estive a pesquisar e, na altura, encontrei um grupo que fazia spray drying e eu achei que podia ser uma técnica interessante para aprender para o meu projeto de doutoramento. Então fiz a minha candidatura, a minha carta de motivação, concorri e felizmente fui aceite e passei lá também 1 mês. Depois, entretanto, fiz mais 2, uma na Alemanha, mas foi mais num contexto de indústria. Na altura, também estava interessada em saber como é que funcionava a parte da indústria, então o meu projeto foi fazer um scale up do meu projeto de doutoramento. E, também, em Sevilha, onde fiz outra missão, mais relacionada com 3D Printing, também assim uma área bastante diferente. No doutoramento eu tentava sempre aprender o máximo possível, até coisas que não fossem diretamente no âmbito do meu projeto, só para ganhar um pouco mais de bagagem de algumas coisas, porque no futuro acho que quanto mais souberes melhor.
[Entrevistadora]: Claro que sim! E que vantagens, assim nestes períodos de mobilidade, achas que pudeste ter, fora ganhar estas competências em diversas áreas? E, por exemplo, no caso de Israel sentiste algum choque cultural ou dificuldade em te adaptares visto que a cultura é bastante diferente e num país completamente novo?
[Entrevistada]: Sim. Ao início eu estava assim um bocado reticente, devo confessar, porque, claro, Israel está envolvido em vários conflitos, como nós sabemos. Mas tudo correu mesmo muito muito bem, nunca me senti insegura, também já conhecia essa menina que esteve no nosso laboratório e ela também foi muito simpática, apoiou-me e foi-me buscar ao aeroporto, foi simpática e estava sempre disponível para ajudar. Mas mesmo as outras pessoas que depois conheci no laboratório, foi mesmo muito tranquilo. Nós aproveitamos, fomos também a uma conferência, aproveitamos os fins-de-semana para passear, fomos àqueles sítios mais turísticos e foi sempre muito tranquilo. E foram sítios que, eu nunca se calhar iria ou não iria para já se não fosse esta oportunidade que eu tive, então essa é uma das vantagens desse tipo de projetos ou de missões, que além da experiência profissional que podes ganhar, das técnicas que podes aprender, podes, também, a nível pessoal desfrutar destes momentos, conhecer culturas novas, conhecer sítios novos e, além disso, também conhecer pessoas novas não só no contexto pessoal, mas também no contexto profissional é muito importante conhecermos pessoas da área, para alargar a tua rede de contactos, principalmente se quiseres ficar na academia a trabalhar ou a fazer investigação, é mesmo muito importante que consigam conhecer pessoas para fazer colaborações, porque nós não temos tudo no nosso laboratório, as outras pessoas também não têm, então se nos ajudarmos uns aos outros melhor. Por isso, acho que é uma boa experiência nesses sentidos e, também, outra vez o inglês, aproveitar para o melhorar em contexto profissional, também em contexto social, porque nós não praticamos isso a trabalhar ou no laboratório, então acho que devemos sempre tentar, porque é sair da nossa zona de conforto, então muita gente prefere “Ah, não, vou ficar por aqui, também é interessante”, mas acho que faz bem também sair da nossa zona de conforto.
[Entrevistador]: Sim, claro, completamente! Acabamos por desenvolver muitas mais skills em meios diferentes do nosso. E, passando agora mais para a experiência mais do trabalho, atualmente trabalhas no estrangeiro, gostaríamos de saber o que te levou a tomar esta decisão e como foi o teu processo de adaptação, nomeadamente o maior obstáculo, por exemplo.
[Entrevistada]: Para ser sincera, eu não pensei em emigrar, foi uma ideia que partiu mais do meu namorado, porque ele nunca tinha tido nenhuma experiência fora, eu já tinha tido estas experiências, eu já estava satisfeita entre aspas com a minha experiência fora, mas ele gostava também de ter essa experiência e, na altura, eu estava a acabar o doutoramento e eu pensei “Ok, vou ter que acabar e também vou ter que arranjar uma coisa nova, por isso, é uma boa altura também para mudar. E, entretanto, viemos para os Países Baixos, na altura eu vim ainda sem trabalho, mas já estava a procurar trabalho em Portugal. Comecei a procurar trabalho, entretanto fui a umas entrevistas cá e depois acabei por ficar na empresa onde estou neste momento. Mas a adaptação foi tranquila, apesar de não falar a língua oficial ser o holândes, eles falam todos os inglês perfeitamente, mesmo muito muito bem, mesmo em supermercados ou alguma coisa desse género eles falam sempre em inglês, por isso nós não sentimos aquela barreira linguística. Claro que se nós soubéssemos o holândes era o ideal, mas o inglês funciona perfeitamente. Depois em termos culturais é bastante diferente, o mindset deles é bastante diferente do nosso, eu sinto que não há tanta pressão no trabalho para fazer as coisas e sinto que eles aproveitam, se calhar, um bocado mais a vida. Por exemplo, uma das coisas que eu sinto falta e que me custa mais é o sol, porque não há muito sol e chove muito e está frio, então sempre que há um raiozinho de sol eles saem logo para aproveitar e tentam aproveitar ao máximo. Mas pronto, isso é uma das coisas que me custa mais na adaptação, no ficar cá, é mesmo a meteorologia porque não é muito parecida à portuguesa e também a comida, porque eles não têm muita cultura também nesse sentido. Mas tirando isso, sinto que é também um bocado difícil fazer amizade com holandeses, porque eles são de cá, têm o seu grupo de amigo, às vezes não são muito abertos para isso, mas felizmente aqui também há muita gente de outros países, muita gente de Portugal, então acabas por fazeres amizades com outras pessoas de outras culturas mais parecidas como os italianos, espanhóis, mas também os Portugueses que cá estão e tem mesmo muitos Portugueses onde eu estou também, por isso, acaba por fazer com que a adaptação seja um pouco mais fácil. Claro que nós sentimos sempre falta da família, dos nossos amigos, mas tentamos sempre fazer com que a coisa funcione.
[Entrevistadora]: Sim, isso de facto é verdade, também fiz um curso de verão, na Holanda, no verão passado e senti muito isso. Apesar da língua não ser uma barreira, porque eles falam muito bem inglês, mesmo os mais idosos, mas de facto, o tempo e a comida, sim. Falando agora sobre o teu cargo atual, como tivestes conhecimento dessa oportunidade, referiste que foste para a Holanda sem um posto de trabalho, mas começaste a procurar, como tiveste conhecimento da oportunidade? E qual o teu papel na mesma? E consideras que o teu percurso académico, o background em engenharia biomédica te forneceu as ferramentas necessárias para desempenharem a função que tens e se achas que alguma das ferramentas que adquiriste ao longo do teu curso, que foi mais importante ou que se sobressaiu aquando do teu recrutamento, ou processo de seleção?
[Entrevistada]: Sim, eu comecei a pesquisar em indústria e também na academia, também tinha, na minha cabeça, realizar um pos-doc. Mas comecei a pesquisar mesmo no Google, empresas Biotech, mais na área onde eu iria viver, em princípio. Eu vivo no sul da Holanda e esta área é mais tecnológica, mais virada para IT e engenharia em si, enquanto no norte é mais saúde e farmacêutica. Procurei especificamente por empresas Biotech, usei também muito o LinkedIn, existem muitas oportunidades de emprego e aqui eles usam-no bastante, não só aqui mas noutros países também. Usam bastante essa ferramenta para encontrar pessoas. E depois foi tentando, enviei muitos currículos, muitas cartas de motivação, mas por acaso a empresa onde fiquei foi das primeiras que contactei e foi a que me respondeu logo no início, tentou logo marcar entrevista. Mas eu vim na altura do Verão, Agosto, então atrasou um bocadinho o processo, estavam muitas pessoas de férias, mas em dois meses consegui o trabalho. Também acho bom fazer esta pausa, especialmente depois do doutoramento que é uma coisa pesada, antes de começar no mundo do trabalho ou numa empresa que é um ambiente muito diferente. Acabei por escolher esta empresa também pela história da empresa, é uma empresa muito pequenina, não tem nada a ver com aquelas farmacêuticas gigantes e foi criada por pacientes, que foram diagnosticados com esclerose lateral amiotrófica, aqui na holanda, são holandeses e não há cura para essa doença, então tentaram fundar uma empresa que os conseguisse ajudar. Eles são empresários, ricos, tinham dinheiro, mas não tinham ninguém que pudesse ajuda-los numa coisa que o dinheiro não paga que é a saúde. Então contactaram a minha chefe e criaram esta empresa, já há dez anos. Mas continua a ser sempre uma empresa muito pequena, foi muito focada neles, nos pacientes e acho que a história da empresa me tocou bastante porque sempre desde o meu doutoramento e do meu mestrado, eu sempre estive muito focada em fazer alguma coisa para alguém e então sinto que às vezes a academia é muito lenta e muito “para os papers”, e é pouco focada no paciente. Esta empresa pensa sempre no paciente, claro que também vai demorar, mas também dá outra motivação, foi por isso que acabei por ficar na empresa e não continuei na academia. Em relação ao background em Eng. Biomédica, foi muito útil porque eu sinto que Eng Biomédica é muito vasta, ou seja, nós sabemos um bocadinho de várias coisas, de parte de engenharia, parte de ciencia, parte de farmácia, depois também dependendo do que fazemos no mestrado, podemo-nos focar mais numa área ou mais noutra. Depende também da tese, mas como esta empresa onde eu trabalho, ela vai desde a fase pré-clínica, ou seja, o desenvolvimento de novos fármacos, até à fase clínica onde testamos os novos fármacos em humanos. Existem várias áreas da empresa onde eu poderia trabalhar desde a fase de formulação até à fase de desenvolvimento, toxicologia, parte clínica. Então acho que o background de já ter feito um pouco de tudo, aprendido esta técnica, ajudou com que eu encaixasse bem na equipa, porque, como eu disse, é uma empresa pequena, o meu papel é translational scientist porque eu tento desenvolver uma formulação para passar para a clínica. Mas na realidade eu faço bem mais do que isso, eu escrevo Grands, eu trabalho também no ensaio clínico, trabalho com patentes, eu faço budgeting, faço planning. Acaba, assim, por me dar uma polivalência, eu acho, para fazer mais do que uma coisa. Claro que há pessoas que gostam mais de fazer isto ou só este tipo de trabalho, mas como é o meu primeiro emprego em indústria, acho que é bom aprender um bocadinho de tudo e, se realmente eu quero continuar na indústria, quanto mais eu aprender melhor. Acaba por ir de encontro ao nosso background, sabemos um bocadinho de tudo. Acho que pode ser melhor para o futuro também, porque estamos a evoluir, a criar a nossa experiência e a definir aquilo que realmente nos queremos especializar no futuro.
[Entrevistador]: Sim, certo. Falando se calhar um bocadinho mais sobre o doutoramento, geralmente, é visto como algo que acarreta uma certa especialização numa determinada área. Consideras que isso foi, se calhar, um obstáculo ou uma dificuldade ao ingressar no mundo do trabalho? Ou, achas que até foi uma mais valia? E não sei se queres abordar também o tema que referiste à bocadinho, a tua motivação para não teres seguido uma carreira académica, acho que é um tópico bastante interessante também.
[Entrevistada]: Eu acho que em Portugal, se calhar, seria um pouco mais difícil. Depois de acabar o doutoramento não tentei, não concorri a nenhuma vaga em Portugal, mas pelo que sei dos meus colegas de doutoramento, sei que és mais difícil ser reconhecido como doutorado, podes conseguir o emprego que queres mas não serás valorizado, mesmo monetariamente. Enquanto aqui, senti que foi uma mais valia, eles buscam muito pessoas especializadas. Também em termos de pós doc, também existem muitas ofertas, ou até mesmo em termos de indústria. Eu estou numa zona com pouca indústria na nossa área, mas de colegas que conheço mais do norte, sei que também são valorizados por isso. O que sinto muito da empresa onde estou, pode ser uma exceção, mas pelo que ouço falar é muito do que acontece aqui, tu és valorizado pelo teu trabalho, valorizam a tua opinião e aquilo que fazes. Nesse sentido, acho que foi valorizado e foi uma mais valia, mas se calhar, noutros países como Portugal, seria mais difícil conseguir um emprego que te valorizassem pelo teu grau. Uma vez mais, não tentei, mas pelo que sei dos meus colegas, é mais difícil.
Sobre o que estavas a dizer, da minha motivação, se já começou desde o mestrado, tive um professor mesmo muito inspirador na altura do mestrado. Fiz o primeiro ano e não sabia bem o que queria fazer e depois das aulas dele eu decidi “quero fazer com ele, gosto muito disto”, porque ele me inspirava bastante. Nas aulas ele falava muito nos pacientes e naquilo que poderíamos fazer por eles e eu sempre tive isso na minha cabeça, gostava de fazer algo para ajudar alguém. No meu doutoramento, que é uma fase muito complicada, que exige muito de nós, senti que por muito que te esforces, é difícil que as coisas cheguem aos pacientes. Há falta de dinheiro e depois temos de escrever uns artigos, conseguir umas grants e até as coisas chegarem e passarem, demora muito tempo e acho que a maior parte dos trabalhos não passa a academia. Isso deixa-me triste e ao mesmo tempo desmotivada porque eu gosto de fazer ciência, investigação, mas gosto de saber que o trabalho que eu estou a ter vai ter impacto na vida de alguém, mesmo que muito pequeno. E então depois, com a história desta empresa, eu realmente achei que o mínimo que eu fizesse ia, de alguma forma, ter impacto na vida de alguém. É uma empresa, somos 5 pessoas, mas eu fui a terceira pessoa a ser contratada, e nestes anos eles evoluíram desde nada para um medicamento que já está em fase 3 e no final deste ano, se tivermos bons resultados, vai passar para o mercado. Então, com poucas pessoas, pouco dinheiro, conseguimos fazer alguma coisa. Estamos todos focados em ajudar alguém e é isso que me motiva mais. Eu conheço os pacientes que fundaram a empresa e eles já estão num estado avançado da doença. Apesar de terem perdido a mobilidade continuam conscientes e eles falam através de inteligência artificial, usam os olhos e estão muito orgulhosos daquilo que estamos a fazer, e isso é algo que nos motiva. Estamos a tentar com Alzheimer também, por exemplo, tenho dois projetos com essa doença e sinto que o pouco que faço e o que tentamos fazer. Nós sobrevivemos, à base de grants, mas até há entidades norte americanas que vêm ter connosco por causa do nosso trabalho e isso acaba por nos motivar também. Acho que também dá confiança para continuar a trabalhar, não é so acordar e ir trabalhar, claro que não é todos os dias, há sempre coisas mais chatas de fazer, mas tento pensar sempre nisso quando me sinto mais desmotivada.
[Entrevistadora]: Olhando, agora, para o todo o teu percurso até ao momento, se soubesses o que sabes hoje, terias feito alguma coisa diferente? E houve algo que não correspondeu exatamente às tuas expectativas num dado momento da carreira?
[Entrevistada]: Essa é uma pergunta difícil porque acho que nós nunca sabemos como seria se tivéssemos feito de forma diferente. É difícil, eu acho que, se calhar, teria dado mais espaço entre o mestrado e o internship e depois comecei como research assistant e logo a seguir doutoramento, isto sem pausas desde que vim de newcastle. Devia ter descansado mais, mas não queria perder a oportunidade. Mas às vezes dá para negociar e esperar um pouco mais. O doutoramento é exaustivo. Só aconselho realmente a fazerem se realmente quiserem ou se o cargo depender desse doutoramento, se quiseres ser professor universitário ou algum cargo mais sénior numa empresa. Mas se não for isso que tu queres fazer da vida, não vale a pena porque vais te cansar imenso, vai ser cansativo e não vai valer o esforço para a tua carreira futura. Se calhar, aquilo que teria feito diferente, pensando agora e olhando para trás, seria, depois do mestrado, se calhar tentar, ou… Porque acabei o mestrado e comecei como research assistant, mas já tinha concorrido a doutoramento, ou seja, já estava à espera de resposta, só trabalhei durante alguns meses. Acho que teria trabalhado mais tempo, quer seja na academia ou quer fosse tentar numa empresa, só para perceber bem aquilo que eu queria. Se calhar eu ia encontrar um trabalho que também gostava muito e não precisava de estar a fazer doutoramento depois no final.
São 4 anos, veio o covid foram 5, com 5 anos consegues ter muita experiência numa empresa ou muita experiência na academia, num laboratório. E isso depois pode dar mais valias para o futuro. Às vezes eu comparo com outros colegas que não fizeram doutoramento, já estão a trabalhar há mais 5 anos do que eu e vemos algumas diferenças. Por isso, acho que às vezes há pessoas que fazem uma coisa a seguir à outra e se calhar não pensamos muito bem, falo por mim própria também, se é realmente isto que queremos para o nosso futuro ou se precisamos. Acho que teria tentado um trabalho e visto. Eu sempre fui um bocado indecisa naquilo que eu queria por isso, para saber o que realmente eu gostava mais de fazer.
[Entrevistador]: Certo, muito bem! Num tom de conclusão, que conselhos, se calhar, darias a quem quer realizar experiências a nível internacional, quer a nível do doutoramento, ou até mesmo no mercado de trabalho?
[Entrevistada]: É preciso algum estofo, no início, principalmente se for sozinho, acaba por haver vários momentos solitários porque nem tudo corre bem. Eu tenho muita experiência de laboratório e as experiências dão muitas vezes errado porque a ciência evolui mas não evolui assim, há muita coisa que não funciona e isso acaba por desmotivar. Mas ao mesmo tempo podes ganhar muito com isso, as viagens que fazes, as culturas que conheces, as pessoas, as amizades e mesmo as pessoas para a tua rede de contatos profissional, acho que é muito importante. Às vezes o Know who é melhor que o Know How ou mais importante que o Know How. Acho que é mesmo importante conhecer as pessoas da tua área, porque colaborações, ajudas, “Olha conheces esta pessoa que conhece aquela pessoa” e assim conseguimos o que precisamos. É como costumamos dizer, uma mão lava a outra. Mas ao mesmo tempo também acaba por te enriquecer muito a nível profissional, porque aprendes técnicas novas, melhoras as nossas hard skills mas também as soft skills, tens de fazer amigos novos, mas ao mesmo tempo acaba por te dar mais oportunidades e acaba por dar uma progressão na carreira para o futuro. Por isso, eu acho que é uma coisa muito boa de se fazer e aconselho toda a gente a fazer, nem que seja só uma vez, por um curto espaço de tempo, como eu fiz. Eu fiz as missions, de um mês, não é muito tempo uma pessoa aguenta fora esse tempo e consegue perceber se é aquilo que gosta, que não gosta, e ao mesmo tempo melhora o currículo e aprende coisas novas.
[Entrevistador]: Certo! Bem, chegamos, então, ao fim e resta-me, então, agradecer-te Andreia, a tua amabilidade e disponibilidade em partilhar a tua experiência hoje. Foi um prazer ficar a conhecer mais sobre as tuas vivências e, certamente, acho que inspiraste todas as pessoas que nos estão a ver em casa. Aguardem novidades! Obrigado!
A ANEEB agradece por teres aceite esta entrevista e pela partilha da tua experiência fora de Portugal, esperando com isto ajudar outros estudantes que estejam prestes a tomar esta decisão. Votos de sucesso!